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Deus no Antigo Testamento

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Deus no Antigo Testamento

Um estudo preparado pelo Pr. Isaltino Gomes Coelho Filho, para a EBD da Igreja Batista do Marco -10 de  outubro de 1999

INTRODUÇÃO

Como é o Deus do AT? A resposta é simples: como é o Deus  do NT. Um equívoco: pensar num Deus iracundo do AT e num Deus bonzinho do NT. O AT fala da misericórdia de Deus, com fartura de textos. Fiquemos com Êx 22.27, 34.6 e Dt 4.31, entre muitos. O NT fala da ira de Deus. Fiquemos com Jo 3.36 e Ap 19.15, entre outros. Por que, então, o assunto? Porque no AT temos o princípio da revelação. Ela é progressiva (Hb1.1-2), encontrando sua culminância no NT. Mas no AT está sua alvorada, tal como Deus, inicialmente, se mostrou aos homens. No NT, temos a pessoa de Jesus que nos amplia o conceito de Deus. Mas, sem ele,  como os homens do AT conheceram Deus? Como formularam seus conceitos sobre ele? Como Deus se mostrou a eles?  Aí, sim, nosso assunto tem nexo.  

1.      É UM DEUS CRIADOR

Parece trivial, mas o AT parte deste ponto: o Deus que se revelou aos hebreus é o criador do universo. Criador do mundo ( Gn 1.1), da humanidade (Gn 1.26) e  da nação eleita (Gn 12.1-2).  Apesar de ser Criador é ele distinto da sua criação. Não se confunde com ela, está acima dela e é superior a ela. Sendo o criador, ele tem domínio sobre ela (Am 5.8 e várias passagens em que ele envia seca e chuva). Isso faz dele o senhor do universo. Por isso, só em Isaías, por 30 vezes ele é chamado de "Senhor dos exércitos" ( Iahweh tsebaöth,  que tem a idéia daquele que domina o exército dos céus, como estrelas, por exemplo). No Sl 29, por exemplo, ele é mostrado como o Senhor da tempestade, dos ventos, dos raios. A natureza mostra seu poder, como vemos no Sl 19.1.  

2.      É UM DEUS PESSOAL

Apesar disso, não é um Deus impessoal, força, energia cósmica.  Ele se comunica e tem propósitos para a humanidade. Pode ser conhecido. "A premissa básica de todos os escritores da Bíblia é que  Deus pode ser conhecido" [i].  "Conhecer" é o verbo hebraico  yadha', que significa "conhecer pessoalmente" (Gn 12.11, no verbo "sei".), "conhecer por experiência" (Js 23.14, no verbo "sabeis"), "ter relações amistosas com alguém" (Gn 29.5, Jó 42.11). Não é o Deus da especulação, mas do conhecimento pessoal. E isto é possível porque ele se revelou, ele se deu a conhecer aos homens, como toda a Escritura mostra.  

3. É UM DEUS DE ATRIBUTOS

Ele tem atributos que o AT deixa claros para seus leitores. Destacaremos apenas três, como exemplo:  

(1)   É eterno – Sl 102.26-27

(2)   É  santo – "Santo de Israel" é aplicado 24 vezes a ele, em Isaías. Is 6.3: o Deus infinitamente santo, proclamado alternativamente pelas parelhas de anjos. Mostra sua distância dos homens, em termos morais.

(3)   É  misericordioso –  Moisés pede para ver a glória (Êx 33.18). Deus promete proclamar o seu nome (Êx 33.19) e o faz: Êx 34.6. sua glória está no seu nome, por isso que dedicaremos um tópico a esta questão.  

4.      A QUESTÃO DOS NOMES DE DEUS

Cultura do AT: o nome era o caráter. Saber o nome era ter domínio:  Gn 32.29 e Jz 13.17-18. O nome era zelosamente guardado diante de estranhos, para evitar encantamentos.

Deus aparece com vários nomes, no AT. Cada um expressa um atributo, ou característica, ou situação dentro do propósito da revelação. Vejamos alguns:

(1)          EL – o nome mais usado. Provavelmente significa "ser forte", "ser poderoso". Gn 28.19: "Betel",  Beith El, "casa de Deus".

(2)          ELOHYM – vairação de  EL.  Melhor dizendo, seu plural. É a forma da língua hebraica de fazer o superlativo. Não significa, necessariamente, "deuses", mas pode significar "ser fortíssimo", "ser poderosíssimo". Encontra-se em Gn 1.1.

(3)          EL ELYON – "Deus Altíssimo" ou "Deus dos altos"  – Gn 14.20. A idéia de um Deus bem elevado sobre os homens.

(4)          EL SHADDAY –  "Deus Todo-Poderoso". Associado com o culto nas montanhas ou, devido ao fato de ser a região de montes baixos, a altura despertar tremor, associado com a divindade em nível elevado.

(5)          IHWH, IAHWEH, IAVÉ, ERRADAMENTE TRADUZIDO, NO PASSADO, COMO JEOVÁ – Nome pessoal, que Deus escolheu para si. É o nome que ele se deu:  Êx 6.2-3. Nossa Bíblia traduz por "Senhor". É o nome pelo qual ele quer ser conhecido: Êx 7.5. Cito, para esclarecer a questão, um trecho de meu livro sobre os dez mandamentos:  

O nome de Deus, como temos transliterado neste livro, é Iahweh.  O leitor pode voltar ao capítulo 2 e ler o que foi dito sobre este nome. Mas ainda acrescentamos algo mais para ajudar na sua compreensão:  Em Êxodo 3.14-15 lemos ‘ehyeh ‘asher ‘ehyeh. ‘Ehyeh é a primeira pessoa do imperfeito do verbo hebraico hayah, que literalmente significa ‘tornar-se’.  O imperfeito indica indefinição e, portanto, a frase  pode significar: ‘eu era quem eu era’; ‘eu estou sendo quem estou sendo’,  ‘sou quem eu sou’ (Êx 3.14) ou ‘eu serei o que serei’  (Êx 3.12). Neste nome, o Senhor  revela seu caráter imutável, inescrutável, insondável e incomparável. Deus não muda e nem deseja mudar seus princípios, seu caráter ou seu eterno plano de salvação (Ml 3.6, Hb 13.8). Embora ‘ehyeh nunca faça parte de algum nome próprio no Antigo Testamento, é usado como uma forma do nome divino na segunda parte de Êxodo 3.14: ‘EU SOU me enviou a vós outros’. A frase contém todas as vogais necessárias e as consoantes ficam bem próximas de YHWH (Êx 3.15), que é o nome para o Senhor.

     A reverência dos hebreus para com  o nome YHWH (chamado de o tetragrama sagrado ou inefável), por causa deste mandamento,  era tão grande que os copistas, ao copiarem as Escrituras, usavam uma pena especial para escrevê-lo. Uma pena de ouro, lavada sete vezes e depois posta de lado. Voltava-se à pena comum para escrever as demais palavras e se retornava à de ouro, quando novamente se chegava ao tetragrama. Mais tarde, o nome foi deixado em branco, tamanho o respeito. O leitor, ao fazer a leitura pública da Escritura, chegando no espaço vazio, parava a leitura. O povo, sabedor que ele chegara ao Nome, prostrava-se, reverentemente. Mais tarde, Deus passou a ser O Nome (Ha Shem), numa maneira reverente de dizer que era único, singular, e acima de qualquer outro nome. [ii]

5.      O DEUS QUE ESTÁ PERTO

"O Santo de Israel"  é usado para designar sua distância dos homens, em termos morais. O AT faz questão de mostrar que ele é diferente dos homens (Os 11.9).  Mas se é um distante, moralmente falando (transcendente), é um Deus que está perto. Veja-se Is 57.15. Veja-se, também, Gn 16.13.

6.      O DEUS MISERICORDIOSO

Um dos maiores vocábulos do AT é  hesed, usado para o amor de Deus, entre muitos outros. Significa o "amor inalterável, imutável, o amor do pacto".  É traduzido por "benignidade", "misericórdia:, "compaixão", em muitos lugares.  É o amor que não deixa de existir, mesmo quando o povo falha. Veja-se Os 11.8-9. Mesmo tendo o povo falhado e estando merecedor de castigo, Iahweh se mostra incapaz de destrui-lo. A melhor definição de  hesed, o amor de Iahweh pelo seu povo, está em Is 49.15.

Outros termos hebraicos aparecem e dão força a esta idéia. Leiamos apenas Sl 103.8 e Sl 89.24.

CONCLUSÃO: COMO AGIR COM ESTE DEUS?

A resposta está em Dt  6.4-7. Dt 6.4 é a  xemá, o maior tesouro teológico dos hebreus. Trata da unicidade de Iahweh. Por ser ele único, deve ser amado totalmente e seu amor e seus atos devem ser ensinados aos nossos filhos, bem como devem ser nossa preocupação na vida. Responder a este amor de Deus deve ser nossa preocupação e deve ser a fonte que nos leve a amar os demais seres humanos: Mc  12. 28-33. Lembremos, como dito, que não temos dois Deus, um dos AT e um outro do NT. O Deus do AT se revelou na pessoa de Jesus: Jo 1.14 e Cl 2.9. É o amor que devemos à pessoa de Jesus.


[i]  CRABTREE, Asa.  Teologia do Velho Testamento. Rio de Janeiro: JUERP, 4ª ed., 1986, p.  58. O destaque é de Crabtree.

[ii] COELHO FILHO, Isaltino.  A Atualidade dos Dez Mandamentos. S. Paulo: Exodus,  1997, p. 55

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