Uma Volta ao Passado para Reencontrar o Rumo
Andarei em campo minado. A prisão de Estevam e Sonia Hernandez, apóstolo e bispa da Igreja Renascer, não pode ser varrida para baixo do tapete. Não finjamos que não houve nada. A Renascer pertence à ala neopentecostal do movimento evangélico. Que dista da ala pentecostal. Que dista da ala tradicional.
O movimento evangélico está desfigurado. Isto se vê nos títulos auto-outorgados. Antigamente, os pastores eram apenas pastores. Agora há bispos, apóstolos, paipóstolo e bispa (o feminino de “bispo” é “episcopisa”, aprendi no primário). Daqui a pouco haverá vice-Deus e quarta pessoa da Trindade, numa megalomania que desfoca o evangelho.
Os adeptos do neopentecostalismo podem me esbordoar à vontade, mas o evangelho não é pregação de riqueza, prosperidade, saquear riquezas dos ímpios, dar ordens a Deus, etc. O evangelho é: “Primeiramente vos entreguei o que também recebi: que Cristo morreu por nossos pecados, segundo as Escrituras; que foi sepultado; que foi ressuscitado ao terceiro dia, segundo as Escrituras” (1Co 15.3-4). Ser cristão não é cantar mantras ou palavras de ordem, mas firmar um compromisso com Jesus: “Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, tome cada dia a sua cruz, e siga-me” (Lc 9.23). Afirmo que o evangelho é a velha mensagem de João 3.16. Afirmo que em lugar algum da Bíblia se diz que Jesus prometeu deixar todos nós ricos, como diz Hagin, ideólogo da teologia da prosperidade, e guru neopentecostal.
Os chamados tradicionais somos zombados porque nossas igrejas não enchem como as neopentecostais (até mesmo porque pregamos “conversão” e não “adesão”). Quando apontamos os desvios doutrinários e a assimilação de práticas do movimento nova era e das seitas metafísicas de Boston pelos neopentecostais acusam-nos de dor de cotovelo. Mas merecemos respeito. Trouxemos o evangelho para este país. Tivemos Bíblias queimadas em praças públicas, templos apedrejados, pastores espancados e presos. Abrimos e pavimentamos a estrada por onde muitos hoje andam, à sombra das árvores que plantamos. O nome “evangélico” que construímos em um século foi para o lixo.
Não culpem Satanás. A culpa é da ganância e da falta de bom senso. Ninguém me convence que um pastor precisa ter um haras de cavalos manga larga. Ou, como diz um outro, alegando ser bênção de Deus, uma coleção de carros antigos. Morar numa boa casa é melhor que morar em cortiço ou favela. Mas a ostentação é pecado.
No dia em que anunciava a prisão dos Hernandez, um site alistava seis notícias favoráveis ao movimento gay. Sobre evangélicos, só a da Renascer. E dizia que agora haveria a dificuldade em sair a Marcha Para Jesus, da Renascer, que rivalizava com a marcha gay. A benevolência com que a mídia trata certos grupos não é a mesma com que trata os evangélicos. E alguns destes contribuem para a mídia seguir na toada de desmontar a oposição aos segmentos que a dirigem nos bastidores. Culpa de Satanás? Não, culpa de evangélicos que não entenderam o evangelho. E de outros que fecham os olhos a qualquer juízo. E não gostam que se faça juízo. Mas julgam quem julga.
Há oportunistas entre nós. E gente que não entende nada de nada. Por isso, precisamos voltar às origens. Voltar ao início do cristianismo e da Reforma, recuperando a essência do evangelho. O evangelho é Cristo crucificado. Só existe um Cristo, o que morreu na cruz, foi sepultado e ressuscitado. A mensagem de Jesus não é a de Lair Ribeiro. Cristianismo não é pensamento positivo ou massagem no ego de pecadores impenitentes. É um chamado à conversão e a engajar-se com os valores do evangelho. O resto é deturpação.
Isaltino Gomes Coelho Filho