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A Arte de se Queixar (E desculpando-me com Machado de Assis)

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A Arte de se Queixar (E desculpando-me com Machado de Assis)

 

Isaltino Gomes Coelho Filho

 

            Eu era seminarista na Zona Oeste carioca, região do glorioso Bangu Atlético Clube, nos anos setentas. Embora ainda garotão, como a igreja estava sem pastor, a liderança espiritual me competia, por decisão da assembléia.  Inexperiente, eu me afligia com as queixas de duas irmãs, que de tudo reclamavam. Uma das suas queixas era que a igreja vivia dentro de quatro paredes e não evangelizava, que só vivia com programas internos, que ignorava os perdidos, etc. Eu me inquietava também com minha situação espiritual. Gostaria de ter aquele zelo pelo evangelismo que as irmãs tinham.

            Uma tarde, autorizado pelos líderes da igreja, convoquei o pessoal para uma “operação arrastão”. Reuniríamo-nos no templo, oraríamos e íriamos de porta em porta, nas imediações da igreja, entregando convites e convidando pessoas para o culto. Naquele tempo havia as organizações da igreja. Era às 18 horas: reunião da Sociedade Feminina, Sociedade Cooperadora de Homens, Uniões de Mocidade, Adolescentes e Juniores. As queixosas chegaram e, como não prestavam atenção em nada, não sabiam que haveria o “arrastão”! Reunimo-nos juntos no salão de cultos, oramos e saímos. As irmãs que queriam a evangelização do bairro ficaram. Outro seminarista foi chamá-las e elas responderam: “Vamos ficar aqui orando para que Deus os abençoe!”.

            Então compreendi. Elas eram muito boas de queixas, mas de serviço, não.

            Provavelmente você já viu este filme. Gente que se queixa, que resmunga, que vê erros em tudo na igreja, mas não faz nada para melhorá-la. “A igreja não investe em missões”, queixam-se. Mas elas não contribuem. “A igreja não tem vida de oração”. Mas pergunte o tempo que elas dedicam à intercessão. “A igreja não evangeliza”, mas elas não testemunham. Uma jovem perguntou ao pastor de sua igreja: “Por que a igreja não está crescendo?”. Ele respondeu: “Porque você não está evangelizando”. São pessoas que não entendem que elas são a igreja, e que esta é tão boa quanto elas.

            Criticar é uma tarefa facílima. Não exige habilidade, talento nem caráter. Basta má vontade. Criticar igreja é fácil e está na moda, principalmente entre os que não conseguem fazer todos iguais a si, e não sabem trabalhar em grupo, e subordinados. É o orgulho de quem sabe como as coisas devem ser feitas e não admite pensar que outros saibam fazer de outra maneira. E dá ibope, porque os queixosos se agrupam em busca de um alvo comum.

            Quando eu era adolescente compus uma quadrinha. Coloquei-a no jornal da mocidade, do qual eu era o redator, e a atribuí a Machado de Assis (que mestre Machado me perdoe). Todos que leram elogiaram. Se eu dissesse que era minha, iriam “cair matando”, dizendo que era uma quadrinha pobre. Agora, maduro, assumo a paternidade, até mesmo porque alguém já a atribuiu ao maior escritor brasileiro. Mas é minha mesmo, e podem dizer que é pobre. Mas que é verdade, isto é. Eis: “Assim entrou o mundo e assim há de sair. Muitos a criticar e bem poucos a construir”.

            É óbvio que não tem o nível machadiano. Mas tem validade. Tanto que arrisco outra: “Assim começou a igreja, e assim há de terminar. Muitos a criticar e bem poucos a edificar”.

            E, mais importante que quadrinhas: antes de se queixar da igreja, pergunte-se qual é a sua participação para melhorá-la. Ela não precisa de apedrejadores, mas de amantes. Ame-a, em vez de se queixar dela. Não seja como aquelas irmãs, cujos nomes esqueci, mas cujas atitudes, infelizmente, não.

 

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