Isaltino Gomes Coelho Filho
Estamos às voltas com mais um dia dos pais. Mesmo comemorada e estimulada pelo comércio, a data não tem o brilho do dia das mães. Em parte porque a figura da mãe é ímpar, quase mística, em nossa cultura. É mais terna, muito romântica.
O pai leva algumas desvantagens na cultura ocidental. Nossa estrutura o apenou (não penalizou, porque “penalizar” é ter pena). Em muitos lares é ele quem fica com a disciplina dos filhos. Chega em casa, à noite, cansado do trabalho, e lhe diz a esposa: “Você precisa dar um jeito nesse menino!”. Isto quando não diz: “Dá um jeito no seu filho!”. E o garoto logo pensa: “Pronto, meu pai chegou em casa, chegou a hora da bronca”.
Além disso, a cultura ocidental vem massacrando o homem. Como há livros tipo “Mulheres que amam, e maridos que (alguma coisa ruim)”, “Por que as mulheres fazem isso (uma coisa boa) e os homens (alguma coisa ruim)”, ou “Mulheres são isso assim-assim (alguma coisa boa) e os homens são aquilo assim (alguma coisa ruim)”. Os homens estão mal na foto, como se diz no popular.
E também há constante desmanchar da autoridade, como vemos em novelas e filmes. Via de regra, os pais são mostrados como falsos, e os jovens como idealistas. Os filhos dão broncas homéricas nos pais, que parecem figuras patéticas. Os jovens têm todos os direitos e nenhum dever, e seus pais têm todos os deveres e nenhum direito.
Mas na cultura oriental, o pai, além de provedor, sempre foi referência e padrão para os mais jovens. Neste ponto, a cultura ocidental poderia aprender e parar de inverter papéis, deixando de apresentar os pais como quem nada sabe e os jovens como idealistas e sabedores de como as coisas devem ser. Por isso que gostaria de valer de dois personagens bíblicos para pensarmos sobre ser pai, à parte de conceitos culturais.
Um é Davi. Deus o chamou de “o homem segundo o meu coração”. Foi um grande rei, o maior de Israel, a ponto de seu nome se tornar sinônimo de Messias. Grande guerreiro, excelente líder, excelente administrador, poeta extraordinário. E péssimo pai. Sua família foi uma bagunça. Seus filhos foram uma calamidade. Há um caso de incesto, em que o irmão violenta a irmã, e um caso de fratricídio, em que um mata o outro. Dois deles, Adonias e Absalão, tentaram depô-lo. Já vi muito pregador atribuir os problemas de família que Davi teve ao seu adultério com Bate-Seba. Curioso! Deus perdoou Davi, mas os pregadores não perdoam. O problema é que Davi foi muito espiritual, mas errou como pai! Temos uma razão na forma como tratou um dos filhos: “E nunca seu pai o tinha contrariado, dizendo: Por que fizeste assim? E era ele também muito formoso de parecer; e Hagite o tivera depois de Absalão” (1Rs 1.6). Um pai frouxo, não corrigiu o filho. Mimou-o demais e não o orientou. Falhou como pai. Há pais que não disciplinam, e sempre passam pela cabeça dos filhos, sempre os desculpam (no sentido de não reconhecer que erraram). Pais devem orientar e estabelecer padrões de disciplina.
O outro é Simão Cireneu (Mc 15.21), que carregou à cruz à força. Quando Jesus saía levando a cruz, ele vinha do campo. Era manhã. Deve ter passado a noite cuidando de rebanho. Era nativo de Cirene, na África. Era negro. É chamado de Simão Níger (At 13.1), literalmente, Simão, o Negro. Tornou-se um dos pastores da igreja. Tinha dois filhos, Alexandre e Rufo. Paulo falou de Rufo e de sua mãe, a esposa de Simão: “Saudai a Rufo, eleito no Senhor, e a sua mãe e minha” (Rm 16.13). A esposa de Simão foi uma mãe para Paulo.
Simão poderia se queixar da cruz. “Só porque sou negro, sou escravo, me colocaram uma cruz de vinte quilos nas costas (peso médio de uma cruz), depois que trabalhei a noite toda!”. Ele a carregou por obrigação. Depois, tomou-a como sua. Passou-a para a esposa e para os filhos. Dois filhos pastores e uma esposa que era mãe adotiva de missionários. Eis um pai que passou seus valores espirituais para toda a família.
Há pais que carregam a cruz sem alegria. Sua fé não é contagiante. A de Simão era. Assim deve ser o pai cristão. Ele assume a cruz de Jesus e a exibe em sua vida. Os filhos vêem que vale a pena, e a assumem também. Um pai que passa valores aos filhos mostra a alegria de tomar a cruz e seguir a Jesus.
Que pai cristão você é? De fé apática? Ou, como Simão, toma a cruz e a ensina aos filhos? Pai cristão digno do nome carrega a cruz com alegria e a ensina aos filhos. Um dia, os filhos a tomam como deles, também. Se isto não suceder, pelo menos o pai terá a consciência tranquila. Cumpriu sua missão. Mas sem dúvida que quando a cruz foi assimilada com realização pelo pai, grande parte do caminho foi andada para que o filho a assuma também com satisfação.
Ser pai é fantástico. Ser pai cristão é mais fantástico, ainda. E ganhar os filhos para Cristo e vê-los no caminho no Senhor é algo que não reconhece limites de satisfação.
Jesus mostrou Deus como Pai. Chamava-o de Pai e ensinou seus seguidores a chamarem-no de Pai. Um sublime modelo para nós. Sejamos dignos do nome de pai. Vivamos à altura do título, com temor, e Deus nos capacite para que cada um de nós seja um pai segundo o coração divino.