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O FALSO CRISTO E O FALSO CRISTIANISMO

Isaltino Gomes Coelho Filho

Charles Colson foi assessor do Presidente Nixon, que teve que renunciar por causa de um escândalo político. Foi preso, e converteu-se a Cristo pouco antes de ir para a prisão. Fundou o ministério Prison Fellowship, que congrega 50.000 voluntários, sendo a maior organização mundial a atuar com presidiários. Já falou em mais 600 de penitenciárias, em mais de 40 países. Por causa desta atividade, em 1993 ele recebeu o Prêmio Templeton, no valor de um milhão de dólares, que doou à Prison Fellowship. Colson tem, ainda, um programa radiofônico que alcança dois milhões de pessoas diariamente.

Colson se tornou um pensador e um evangelista. Seu último livro que li foi A fé em tempos pós-modernos. Num capítulo em que aborda a questão do sofrimento, ele critica a pregação que anuncia o “Pare de sofrer!” como sendo a essência do evangelho. Ele comenta os sofrimentos de cristãos na Índia, Coréia do Norte e Mianmar (ex-Birmânia). Inicia o capítulo falando sobre o teólogo alemão Dietrich Bonhoeffer, que era professor de Teologia, na Alemanha, opusera-se a Hitler, e, por correr risco de morte, de lá foi tirado e levado para os Estados Unidos.

Eis uma declaração que ele cita, de Bonhoeffer, sobre uma experiência espiritual que este tivera: “Pela primeira vez, descobri a Bíblia […] Eu pregara muitas vezes, aprendera muito sobre a igreja, falara e pregara sobre ela, mas não me tornara cristão […] Transformava a doutrina de Cristo em algo que me desse vantagem pessoal […] Peço a Deus que isso jamais se repita. Também jamais havia orado ou orara pouquíssimas vezes […] Ficou claro para mim que a vida de um servo de Jesus Cristo tem que pertencer à igreja, e, passo a passo, ficou cada vez mais claro para mim até onde isso deve ir” (p.  167/8). Assim, ele voltou para a Alemanha, para servir a igreja perseguida por Hitler, e lá acabou enforcado. Antes de subir ao patíbulo, ajoelhou-se e orou fervorosamente. Ele foi para se identificar com a igreja de seu país, sofrer com ela, e morreu por suas posições. Seria tão fácil cantar um cântico dizendo que Deus o abençoara e o tirara da morte! Ele era um abençoado! Mas e seus irmãos que sofriam, na Alemanha?

O verdadeiro cristianismo parte daqui, de uma frase de Bonhoeffer: “Quando Jesus Cristo chama um homem, ele o chama para morrer”. É o que Jesus disse: “Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, tome cada dia a sua cruz, e siga-me” (Lc 9.23). Sim, este é o verdadeiro cristianismo, o cristianismo da cruz, do Cristo crucificado. Porque só há um Cristo digno de ser crido e pregado, o crucificado: “Porque nada me propus saber entre vós, senão a Jesus Cristo, e este crucificado” (1Co 2.2).

Prega-se hoje o cristianismo do trono: “Sou filho do rei e mereço o melhor”, dizem alguns gananciosos que usam o evangelho para pretexto de sua visão materialista de vida. O próprio Rei optou pela cruz. Mente e falseia o evangelho quem oferece um trono ou uma vida repleta de bênção, sem sofrimento algum, em nome de Cristo. As lutas e as dificuldades, até mesmo as quedas eventuais, fazem parte da pedagogia divina. Catarina de Bora, esposa de Lutero, disse: “Eu jamais teria entendido o significado dos diversos salmos, nem valorizado certas dificuldades, nem conhecido os mecanismos internos da alma; eu jamais teria entendido a prática da vida e obra cristãs, se Deus nunca tivesse trazido aflições à minha vida”. Sim, porque é nos sofrimentos que nos sensibilizamos mais para a voz de Deus. É raro, quase duvidoso, que alguém encontre Deus num programa de auditório, num jogo de futebol, ou em um bloco de carnaval. Mas quantos o encontraram num leito de dor, ou à beira do túmulo de alguém amado!

O verdadeiro Cristo é o da cruz. O verdadeiro cristão é a da cruz. Martinho de Tours, em homenagem de quem Lutero recebeu o nome de Martinho, teve uma visão em que Satanás lhe apareceu na forma do Salvador. Quando estava quase se ajoelhando diante dele, Martinho olhou para suas mãos e não viu nelas os sinais dos cravos. Então perguntou: “Onde estão as marcas dos cravos?”. Diante desta pergunta, a criatura desapareceu. Sem as marcas da cruz não há Cristo nem cristianismo. Desafortunadamente, algumas igrejas têm trocado a cruz pela menorá, pela estrela de Davi, e têm trocado a cruz por bem-estar pessoal. É o falso cristianismo. Por isso, faço coro às palavras de Colson: “A dura verdade é que muitos enxergam o cristianismo como meio de melhoria individual ou como caminho para uma vida bem-sucedida” (p. 226). Que visão lamentável!

Um falso Cristo, sem a cruz, sem sangue derramado. Um Cristo sintético, de plástico, não o que derramou o seu sangue pelos nossos pecados. Um falso cristianismo, sem a cruz, sem o compromisso, sem a autodoação (a não ser doação de dinheiro para manter alguém), sem a identificação com o Crucificado. Uma busca de melhora de vida, e não de identificação com Cristo.

Só há um Cristo digno de ser crido, o crucificado. Só há um cristão verdadeiro, o crucificado. Sem a cruz, o cristianismo não existe. Nem o cristão. A Bíblia não nos chama a nos identificarmos com ele pelo trono, mas pela cruz: “Mas regozijai-vos por serdes participantes das aflições de Cristo; para que também na revelação da sua glória vos regozijeis e exulteis” (1Pe 4.13). É preciso identificar-se com ele pela cruz.

Quem queira o trono que tome a cruz. O trono é do Crucificado e dos crucificados. Quem sofre por sua fé não é um crente de segunda classe, mas um felizardo: “Bem-aventurados os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus. Bem-aventurados sois vós, quando vos injuriarem e perseguiram e, mentindo, disserem todo mal contra vós por minha causa. Alegrai-vos e exultai, porque é grande o vosso galardão nos céus; porque assim perseguiram aos profetas que foram antes de vós” (Mt 5.10-12).

Muito cuidado com quem oferece riquezas. Pode não ser Jesus, e sim o inimigo. Ele oferece riquezas: “Novamente o Diabo o levou a um monte muito alto; e mostrou-lhe todos os reinos do mundo, e a glória deles; e disse-lhe: Tudo isto te darei, se, prostrado, me adorares” (Mt 4.8-9). O inimigo nunca oferecerá a cruz, porque ele a odeia e a teme. Quem não quer a cruz está do seu lado, não do lado de Cristo. Por isso, quem deseja ser um cristão de verdade, tome a cruz e siga o Crucificado.

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