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O PROFETA JEREMIAS

Um estudo preparado pelo Pr. Isaltino Gomes Coelho Filho

INTRODUÇÃO

Jeremias foi um homem incompreendido em sua época. Foi também um homem solitário. E cheio de adversários. Poucos homens foram tão hostilizados como ele. Não há profeta que tenha padecido mais que ele, e no restante da Bíblia, quem pode se ombrear é Paulo, em termos de perseguição. É chamado de “o profeta chorão”, um epíteto que mostra um conhecimento bastante superficial sobre sua vida. Na realidade, chamá-lo de “chorão” é uma injustiça. É um gigante entre os profetas e de chorão não tem nada. Num sermão no texto de Jeremias 2.13, o saudoso Pr. José dos Reis Pereira disse que Jeremias era um gigante espiritual, numa geração de pigmeus. Um bom termo: um gigante, não um chorão.

De maneira sábia, o Dr. Page Kelley comentou que o reconhecimento da grandeza de Jeremias só veio nos dias do Novo Testamento. Quando Jesus perguntou o que os homens diziam sobre ele, a resposta dos discípulos foi “Uns dizem que és Jeremias”. Mais de seiscentos anos depois Jesus, o Filho de Deus, o homem perfeito, foi confundido com Jeremias redivivo. Que glória para Jeremias! Pensaram que o Filho de Deus era ele, que revivera. Que saibamos reconhecer a grandeza deste profeta.

1.TÍTULO – O nome “Jeremias” vem do hebraico Yirmeyahu (Yirme-Yâh) que significa “Iahweh estabelece” (ajuda, exalta, designa, lança).  O livro de Jeremias é o maior livro profético do AT.

2. O AUTOR – Jeremias, como dito, é conhecido como o “profeta chorão. Também o chamam de  “o profeta do coração quebrantado” (Jr 9.1; 13.17; 14.17; Lm 1.16; 2.1). Ele nasceu em 647 a.C. em Anatote (Jr. 1.1), pequena vila sacerdotal cerca de 5 km ao nordeste de Jerusalém, e, segundo a tradição judaica, teria morrido por volta de 582 a.C., aos 65 anos (647-582), apedrejado no Egito pelos judeus que ele tentou ajudar (Jr 43.1-8). Filho de Hilquias,  provável sumo sacerdote na ocasião da reforma de Josias (641-609 a.C.) e  bisavô de Esdras (Ed 7.1).  A família parece ter tido boas condições financeiras, pois Jeremias comprou um terreno de um parente falecido (Jr 32.9-10).

Constituído profeta antes do seu nascimento (Jr 1.5), Jeremias começou seu ministério aos 20 anos (ou um pouco menos) em 627 a.C. no 13º ano do reinado de Josias.  Normalmente um sacerdote começava a trabalhar aos 30 anos de idade (Nm 4.3), mas Jeremias foi “seduzido” (iludido) por Deus ao ministério (Jr 20.7). Foi proibido de se casar como sinal ao povo da iminente destruição de Jerusalém (Jr 16.1-5). Ministrou por 40 anos em Jerusalém (627-586 a.C.), e durante os 5 anos no Egito (Jr 43-44), ministrando a 5 reis diferentes (Josias, Jeoacaz, Jeoiaquim, Joaquim, e Zedequias, e um governador de Judá (Gedalias) após a queda (2Rs 25.22-25). Chamado bem jovem ao ministério profético, foi privado das bênçãos que um homem comum desfruta.

Apesar de ser um homem compassivo e profundamente sensível, Jeremias foi chamado para proclamar inexorável julgamento contra Judá.  Sua mensagem era dupla:

(1)   Negativa – destruir, arrancar, derrubar, arruinar;

(2) Positiva – edificar, plantar (Jr 1.10).  Considerado um traidor devido a estes pronunciamentos, Jeremias não viu uma só pessoa se converter ao longo do seu ministério. Foi ridicularizado, desprezado, ameaçado, difamado, amaldiçoado, açoitado, jogado num poço lamacento (Jr 11.18-23; 12.6; 15.10; 18.18; 20.2,10; 26.8-11,24; 32.2; 36.23,26; 37.15-16,21; 38.6-13,28; 40.1; 43.6-7).

Sua mensagem básica foi convencer os judeus que Babilônia era um instrumento usado por Deus (Is 43.13-15) para castigar seu povo. Foi uma mensagem impopular, pela qual foi considerado como traidor, trabalhando e profetizando a favor do inimigo (Jr 26.8-14; 27.8,11-17; 29.7; 38.17,18). Jeremias era um homem de rixas (Jr 15.10), não podia ir aos banquetes (Jr 16.8), foi perseguido por fora, mas sentiu um fogo por dentro (Jr 20.9). Chegou a ponto de até amaldiçoar o dia de seu nascimento (Jr 20.14-18), pois os homens de Anatote queriam matá-lo (Jr 11.21) e até seus próprios irmãos estavam contra ele (Jr 12.6).  Era um homem de coração partido e um livro queimado (Jr 36.23,32). E odiado por quase todos. Numa época em que a liderança evangélica busca o aplauso do mundo, Jeremias aparece na contra-mão. A lealdade à palavra de Deus é mais importante que qualquer outra lealdade.

3. AUTORIA – A autoria nunca foi contestado, pois o livro tem numerosas referências biográficas de Jeremias como autor (citado 131 vezes) e de Baruque como escrivão (citado 23 vezes).  Daniel 9.2, Esdras 1.1, e a tradição judaica dão crédito à autoria de Jeremias.  Não escreveu capítulo o 52 (Jr 51.64).  Veja Jerremias 36.1-3; 22-23; 32.

4. SITUAÇÃO HISTÓRICA – Mostrada em 2Reis 22 a 25;  2Crônicas 35 a 36. Após a morte de Isaías, Deus não se revelou a nenhum profeta por um espaço de mais de 50 anos durante os terríveis 55 anos do reinado de Manassés (2Rs 21.1, 2, 4,5,6,9,16; 24.3,4; Jr 15.4).  A condição moral era péssima. A religiosidade era uma fachada cobrindo a impiedade e injustiça, o “templo do Senhor” usado como um talismã (Jr 5.31; 7.4-11; 8.10; 16.12; 23.11,14).

No início, Judá fez alianças com os assírios contra os egípcios, ou com os egípcios contra os assírios.  A mensagem de Jeremias foi a de confiar em Deus pela proteção e não nas alianças feitas.  Em termos de Babilônia, a mensagem de Jeremias foi de render-se a Babilônia para não ser totalmente destruído (Jr 38.17,18).

5. TEMA – O julgamento de Deus sobre um povo rebelde

6. PALAVRAS CHAVES –  Há duas palavras que se constituem na espinha dorsal do conteúdo do livro: (1) “Volte” (voltar), que surge 47 vezes; (Jr 3.12,14,22; 4.1; 8.4,5; 12.15; 15.19; 24.7, por exemplo) e (2) “Convertei-vos” – (Jr. 18.8,11; 25.5; 26.3; 35.15, por exemplo)

7. CENÁRIO POLÍTICO – Algumas datas históricas, internacionais significativas durante a profecia de Jeremias:

(1) 626 a.C. – Nabopolasar, da Babilônia, com ajuda dos medos, toma a cidade de Babilônia dos assírios.

(2) 612 a.C. – Os babilônios destroem Nínive. Em 610 a.C. eles tomaram Harã. (2Cr 35.20-25)

(3) 609 a.C. – Josias morre em Megido ao tentar impedir Faraó Neco de auxiliar a Assíria contra Babilônia (2Rs 23.29).

(4) 606 a.C. – Nabucodonosor liberta Jerusalém do controle egípcio; deporta judeus como Daniel a Babilônia.

(5) 605 a.C. – Babilônia derrota o exército egípcio em Carquemis e assume o controle de toda a Palestina.

(6) 597 a.C. – Nabucodonosor invade Jerusalém duas vezes, mata Jeoiaquim (Jr 36.30), prende Joaquim; saqueia o templo e deporta 10.000 pessoas da camada alta da população, incluindo Ezequiel (2Rs 24.11-16).  Coloca Zedequias como rei de Judá.

(7) 586 a.C. – Destruição do templo e de Jerusalém depois do sítio de um ano e meio (2Rs 25.1-12; Jr 39.1-10; 52.4-27).

(8) 568 a.C. – Nabucodonosor conquista o Egito (Jr 44.1-30, profetizado em 586 a.C.)

(9) 562 a.C. – Evil-Merodaque torna-se rei da Babilônia; liberta Joaquim (Jr 52.31-34, texto que não foi escrito por Jeremias, mas talvez por Baruque ou um dos seus discípulos).

8. CENÁRIO RELIGIOSO – Algumas datas religiosas significativas:

(1) 632 a.C. – Josias, aos 15 anos, começou a buscar a Iahweh (2Cr 34.3).

(2) 628 a.C. – Purificação do templo; remoção da idolatria (2Cr 34.3-8).

(3) 622 a.C. – O Livro da Lei achado; celebra-se a maior festa da Páscoa desde Samuel (2Cr 35.1, 7,18).

(4) 609 a.C. – Josias morto (2Rs 23.29); quatro reis ímpios depois (Jeoacaz-3 meses, Jeoiaquim-11 anos, Joaquim-3 meses, Zedequias-11 anos).

A condição moral da época de Jeremias degenerou de bom para o ruim e depois para o pior.  Até os líderes religiosos estavam completamente corrompidos (Jr 5.30,31; 8.10,11; 14.13,14; 23.11, 14, 16, 25, 26; 27.9-15).  Enquanto Jeremias continuou fiel a Deus e ao povo antes e depois do julgamento divino, os judeus continuaram obstinados, rebeldes e impenitentes, antes e depois  do julgamento (Jr 44.15-19).

9. DATA DA REDAÇÃO – Jeremias começou a escrever cerca de 605 a.C. (Jr 36.1, 2, 4; 45.1).  Depois de destruído aquele rolo, ele escreveu as mesmas palavras, acrescentando ainda outras (Jr 36.22-28,32). Escreveu uma carta aos cativos em 597 a.C. (Jr 29.1).  Mais tarde escreveu sobre o julgamento de Babilônia (Jr 51.60).  Os últimos quatro versículos (Jr 52.31-34) e provavelmente todo o capítulo 52 (Jr 51.64) foram escritos em 562 a.C. e, portanto, não por Jeremias, que se calcula, morreu cerca de 582 a.C. O livro de Jeremias, assim, foi composto durante muitos anos.  Lamentações foi escrito depois de 586 a.C.

10. OBJETIVO DO LIVRO – Registrar as admoestações de Deus a um povo rebelde que não apenas rejeitou a lei de Deus, mas também recusou inflexivelmente a correção de Deus anunciada pelos profetas.

11. RECURSOS PEDAGÓGICOS DE JEREMIAS – Como bom pedagogo, Jeremias utilizou recursos visuais:

(1)   13.1-11 – O cinto de linho escondido no Eufrates onde apodreceu

(2)   16.2, 8 – Não se casou, nem comeu ou bebeu em banquete.

(3)   18.1-8 – O oleiro e o barro

(4)    19.1-13 – A botija quebrada

(5)    24.1-10 – Dois cestos de figos

(6)   27.1-8 – Um jugo no pescoço

(7)   32.6-15 – A compra do campo do parente

(8)   35.1-19 – A obediência dos recabitas

(9)    43.8-13 – As pedras escondidas

(10) 51.63,64 – O livro jogado no Eufrates

12. PROFECIAS DE ESPERANÇA – Há dois temas proféticos:

(1) A volta depois de 70 anos no cativeiro (Jr 25.11,12; 29.10)

(2) Um cumprimento maior no futuro, em vários breves textos (Jr 3.16-18; 12.14-15; 23.5,6; 30.3-7; 31.8, 9, 28-34; 32.37-44; 33.15-21).

13. NOVA ALIANÇA – 31.31-34; 32.37-40 – Uma nova aliança foi profetizada para substituir (ampliar) o pacto condicional dado a Moisés no Sinai (31.32), que foi rejeitado pelo povo, resultando na sua expulsão da terra prometida (11.2-10).  Será um guia interior para o coração e não um código legal externo (Hb 8.7-13; 10.16-17). É muito oportuno estudar este tópico por causa do processo de rejudaização a que a igreja é hoje submetida, com muita gente negando a Cristo, e querendo retornar à primeira aliança, que caducou.

14. MENSAGEM DE JEREMIAS

QUATRO TEMAS ênfase ELEMENTO DE TEMPO
DESTRUIÇÃO 1. Repreender Pecado do povo Condição atual (2.1-37)
2. Acautelar A justiça de Deus Futuro predito ( 4.20)
CONSTRUÇÃO 3. Convite A graça de Deus Oferta atual ( 3.13-15)
4. Consolação Esperança do povo Futuro predito (32.37-41)

15. UMA RADIOGRAFIA DO LIVRO DE JEREMIAS O livro não está em ordem cronológica. Por isso, seu entendimento histórico se torna complicado. Para ter uma cronologia, veja Plamplin, em sua obra “Jeremias, Seu Ministério, Sua Mensagem” (Juerp). Veja também “O Novo Dicionário da Bíblia”, em  “Jeremias”, no tópico V,  “Seus Oráculos”. Mas o essencial pode ser traduzido assim: pouco mais de vinte anos antes de Babilônia destruir Judá, Jeremias já o dizia.  Entendia que era o juízo de Iahweh sobre nação pela quebra da aliança.  Eis uma radiografia do livro:

(1)   Judá será destruído por Babilônia – 6.22-26

(2) Se deixar o pecado, Iahweh livrará a nação (7.5-7). O templo, apesar de todo o seu significado, que estudamos na apostila anterior, não livraria a nação – 7.4, 9-11.

(3) Quando tudo parecia perdido, nova mensagem de Jeremias: Judá deve aceitar o jugo caldeu e assim será poupado da destruição – 21.8-9.

(4) Judá será destruído e cativo por 70 anos (25.11, conferir com 2Cr 36.22). Depois, será restaurado (Jr 30 e 31) e dará um grande rei ao mundo (33.15). Aqui, a teologia do livro sofre uma guinada, pois os vislumbres da nova aliança já se fazem sentir.

(5) Babilônia será destruída e nunca mais se reerguerá (25.12). Confira com Isaías 13.19-22.  Quando lhe falarem da reconstrução de Babilônia para ajustar sistemas escatológicos, lembre-se destas passagens. Babilônia nunca mais será reconstruída. Os capítulos 50 e 51 tratam da destruição do poder caldeu. Uma grande lição: Deus pune o mal. Por mais poderosos que sejam os ímpios, Deus os punirá.

BIBLIOGRAFIA

  1. Plampin, Richard. Jeremias, seu ministério, sua mensagem. Rio: Juerp,  1987
  2. Mesquita, Antonio. Estudo nos livros de Jeremias e Lamentações de Jeremias. Rio; Juerp,  2ª ed., 1980
  3. Skinner, John. Jeremias – profecia e religião. S. Paulo: ASTE, 1966
  4. Harrison, R. Jeremias e Lamentações. S. Paulo: Vida Nova, 1980
  5. Almeida, Joãozinho. Jeremias, homem de carne e osso. S. Paulo: Paulinas, 1997
  6. Boggio, G. Jeremias, o testemunho de um mártir. S. Paulo: Paulinas, 1984
  7. Andrade, José Sélio. Os profetas maiores (II) – Jeremias, Lamentações, Ezequiel e Daniel. Rio de Janeiro: Juerp, 2004.
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